segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O papel da cor da pele no governo Obama

Fonte: The New York Times, em 29 de outubro de 2012.

Barack Obama raramente tece reflexões sobre a experiência de ser o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, convertendo em algo quase ordinário o que antes dele era extraordinário.

Mas sua tranquilidade aparente oculta a ansiedade e a emoção com que, segundo assessores, ele atua em sua posição histórica: orgulho pelo que realizou, determinação para fazer um bom trabalho e frustração intensa. Obama busca um equilíbrio entre dois impulsos: a visão de que a política universal não é baseada em critérios raciais e a promoção da vida negra e seus desafios.

Atento para não criar pontos de atrito raciais, o presidente é reservado e cuidadoso ao falar sobre o assunto. Seus assessores orquestram com muita diplomacia as aparições de personalidades negras e manifestações de cultura negra na Casa Branca. As pessoas próximas a Obama dizem que ele se irrita por ser incompreendido – não apenas por adversários que insinuam que ele favorece os afro-americanos, mas também por intelectuais e parlamentares negros que o criticam por ele não fazer de sua Presidência um ataque frontal à disparidade racial.

“Tragicamente, parece que o presidente se sente constrito por sua negritude”, disse o apresentador de rádio e televisão Tavis Smiley. “Tem sido doloroso, em alguns momentos, assistir ao tratamento calculado, cauteloso e por vezes indiferente dado pelo presidente à sua base eleitoral mais leal. Os afro-americanos perderam terreno na era Obama.”

De acordo com assessores, críticas desse tipo deixam o presidente ressentido e sentindo-se traído por aqueles que ele acha que deveriam ser seus aliados.

Observadores atentos dizem que Obama está ficando mais confiante para falar de raça em público, da mesma forma que o faz em conversas particulares.

Indagados sobre quando puderam perceber essa mudança, vários assessores e amigos mencionaram o final da festa de aniversário de Obama em 2011. Quando ficou tarde, muitos dos convidados brancos foram embora, e a música ficou “mais e mais negra”, como o humorista Chris Rock contou a uma plateia mais tarde. Quando viu artistas e atletas afro-americanos dançando o Dougie (movimento de dança hip-hop) para celebrar um presidente negro numa Casa Branca construída por escravos, disse Rock, “senti que eu tinha morrido e ido para o céu negro”.

Hoje Obama preside uma Casa Branca que projeta a unidade transracial. Muitas de suas decisões mais críticas de política doméstica beneficiaram afro-americanos: pacotes de estímulo que mantiveram os empregos de funcionários públicos, doações para o setor educacional para ajudar escolas com desempenho fraco e uma reforma da saúde que vai garantir cobertura médica a milhões de americanos. Mas Obama apresenta essas medidas como políticas que visam ajudar os americanos de todas as origens.

Falando reservadamente, assessores da Casa Branca frequentemente dissecam a dinâmica racial da Presidência, perguntando se o deputado republicano Joe Wilson, da Carolina do Sul, teria gritado “o senhor mente!” para um presidente branco durante um discurso perante o Congresso, ou qual é o significado real de cartazes do Tea Party pedindo “Vamos Tomar Nosso País de Volta”.

Obama é circunspecto quanto à questão de parte da oposição a ele ser movida pela questão racial. Assessores dizem que o presidente tem plena consciência de que alguns eleitores dizem que nunca se sentirão à vontade com ele, além das ocasionais manifestações de racismo na campanha, como a camiseta, vista num comício recente de Mitt Romney, estampada com a frase “Vamos Devolver o Branco à Casa Branca”. Mas eles dizem, também, que Obama é disciplinado, obrigando-se a não reagir, porque fazê-lo poderia facilmente provocar reações contrárias indesejadas.

Mesmo quando Newt Gingrich o descreveu como “presidente dos tíquetes-alimentação”, nas primárias republicanas, o máximo que Obama fez foi lançar um olhar cheio de significado para seus confidentes, como se dissesse “não vou dizer nada, mas já estou dizendo”, comentou um assessor.

Aos negros que o acusam de não ser agressivo na questão racial, Obama responde: “Não sou o presidente da América Negra. Sou o presidente dos Estados Unidos da América.”

Na primeira reunião de seus maiores doadores de campanha, no ano passado, alguns doadores negros ficaram consternados quando funcionários distribuíram fichas com tópicos sobre as conquistas obtidas pela administração Obama em favor de grupos diversos: mulheres, judeus, gays e lésbicas. Mas não havia ficha para os afro-americanos.

Pouco antes de sua posse, em 2009, Barack Obama levou sua família para conhecer o Memorial Lincoln. “Primeiro presidente afro-americano... é bom que você seja bom”, disse Malia Obama, então com 10 anos, a seu pai, que relatou o caso mais tarde.

Apesar de toda a cautela de Obama, ele está numa missão, dizem seus assessores: mudar os estereótipos relativos aos afro-americanos, incentivando, por exemplo, realizações de negros na ciência e na engenharia.

O professor de direito em Harvard Charles J. Ogletree disse que Obama sabe que o próximo candidato presidencial negro poderá ser avaliado segundo o desempenho dele, Obama.

Um assessor da Casa Branca falou que o desejo de Obama de ser reeleito é em parte pelo fato dele ser o primeiro presidente negro: “é tão implícito que é como a respiração”.


terça-feira, 9 de outubro de 2012

Guerra é guerra? (um post sobre violência em SP)


Hoje fiquei me questionando, quem é mais bitolado? Nós que assistimos Jornal Nacional e Globo News, altamente higienizados, ou os que assistem ao Cidade Alerta da Record? Enquanto discutimos de forma asséptica a política, as eleições, o julgamento do mensalão, uma guerra esta em curso no submundo paulista. Policiais Militares e supostos bandidos têm se enfrentado diariamente nos bairros da periferia, em especial no extremo sul da capital e no litoral santista. 

Nos últimos seis dias, 44 pessoas foram assassinadas em SP capital. Só de ontem pra hoje, foram 13. Todas vitimadas em supostas “trocas de tiros” entre bandidos e policiais da ROTA (grupo especial da PM). Vivemos num estado de tensão generalizada em SP, apesar de nossos assépticos jornais não mostrarem isso. Está morrendo gente todo dia, e o que é pior, o discurso dos fascistas têm sido veiculado nos programas policiais: “bandido bom é bandido morto”.

“A polícia tem sido alvo de bandidos e tem que reagir evidentemente” foi a fala de hoje (09/10) de Marcelo Rezende, apresentador do programa Cidade Alerta (Record).

Mas quem são estes bandidos afinal? Aquilo que nós jornalistas aprendemos desde cedo que é NÃO dar como certo algo que é passível de ser questionado, ou seja, a usarmos o “suposto” antes das palavras ladrão, assaltante, bandido para tratar de alguém que é suspeito de cometer algum crime, parece que é ensinado de forma contrária nos cursos preparatórios da PM em SP. Em São Paulo, mata-se primeiro e pergunta-se depois. Inquérito? Pra que inquérito? Pra que julgamento? A Lei tem sido a da Execução Sumária.

Alckmin (PSDB), governador do Estado de SP, teve a pachorra de dizer em entrevista ao Jornal Nacional que o problema é de fronteira, de tráfico de armas e de drogas, ou seja, do Governo federal. Mas não tocou nem de leve na polêmica em torno das ações da ROTA nos últimos meses. Mata-se policial, mata-se bandido, mata-se policial bandido, mata-se bandido treinado por policial. Tem bomba; o arsenal é de guerra!

Como reagir a isso? Realmente não sei. Mas o fato é que há um processo de militarização da capital paulista (e outras regiões) que assusta. E que essa militarização não tem se revertido em maior sensação de segurança, ao contrário, aumenta a sensação de que, de fato, estamos em GUERRA! E se Guerra é Guerra, a questão é de que lado você samba...