terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Transestética da banalidade


A banalidade das coisas faz com que não percebamos o que na origem as diferencia

Recebi esta semana um email com algumas imagens interessantes nas quais o “Che”, este mesmo, o Guevara, era a tema central. As imagens eram encabeçadas por um questionamento afinal “Why is Che Guevara such a pop culture icon?”. Por mero acaso, andei estudando recentemente (e novamente) a noção de Indústria Cultural, trazida por Adorno & Horkheimer, e fato é que a difundida imagem do revolucionário “Che” Guevara não escapa ao “desgostoso” vício social contemporâneo: o consumo.

Situação absolutamente paradoxal o fato de que a Indústria Cultural tratou de se apropriar e aprisionar em camisetas juvenis a imagem de um líder revolucionário cuja luta foi direcionada justamente para a transformação dessa mesma sociedade. Mas o consumo vive de nossas contradições e paradoxos, oferecendo-nos a cada dia, o nosso novo e possível objeto perdido da pulsão.

Acima, a imagem aparece sendo formada pelas mais importantes marcas do mundo "globalizado" (do artista Patrick Thomas Ilenó).

Há quem defenda que o consumo democratiza, permite inclusão e participação, fruição diriam os mais entusiastas (afinal, não fosse a difusão da imagem, pouca gente no mundo teria acesso ao homem). Por outro lado, a disseminada imagem de “Che” não tornou sua luta mais ampla ou mais presente na mente dos jovens que caminham por ai e por aqui, estampando sua imagem nas camisetas. Outro dia, pelo contrário, li uma matéria que mostrava jovens neonazistas na Alemanha usando “Che” como um trunfo nacionalista (isso mesmo, nacionalista), contra a presença do “outro” em seus países.

Poderíamos dizer então que o sentido (significado) de “Che” foi embora, assim como foi embora o homem (referente) ficando tão somente o significante, a imagem, o signo, esvaziado de sentido. A imagem de “Che” sobreviveu, porém sem a força de contestação, sem sua verdade, seu conteúdo construtivo. Infelizmente sobreviveu transformada em objeto fetichezado das passarelas da moda.

Crítico da pós-modernidade, o francês Jean Baudrillard, já havia postulado, na agora distante década de 1960, o vir a ser deste estado de dispersão quando evocou a tese “quando tudo é, nada é”. Segundo ele, “quando as coisas, os signos, as ações são libertadas de sua idéia, de seu conceito, de sua essência, de seu valor, de sua referência, de sua origem e de sua finalidade, entram então numa auto-reprodução ao infinito”.

Em outras palavras, o desaparecimento da idéia, do conteúdo, agora não mais se dá pela supressão (ou pela morte), mas pela reprodução incessante, pela dispersão – como num jogo de imagens refletidas em espelhos antepostos, formando infinitamente os fractais. O que há agora é o jogo da indiferença. Usando as palavras do francês, “já não há modo fatal de desaparecimento, mas sim um modo fractal de dispersão”.